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Processo da ONU sobre TNCs e direitos humanos: Estratégias de divergência continuam

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No âmbito da 52ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Presidente-Relator do Grupo de Trabalho Intergovernamental encarregado da elaboração do Tratado Vinculativo sobre Empresas Transnacionais (TNCs) e Direitos Humanos, o novo Embaixador do Equador na ONU, Sr. Cristian Espinosa Cañizares, apresentou o relatório da 8ª sessão do Grupo de Trabalho, que se realizou em outubro de 2022. Para enfrentar as últimas estratégias da Presidência equatoriana para descarrilar o processo, endossadas por seus aliados, a Campanha Global para recuperar a soberania dos povos, desmantelar o poder corporativo e acabar com a impunidade (Campanha Global) interveio no debate, reiterando a necessidade de relançar o processo a fim de cumprir seu mandato original.

Parte desta estratégia de desvio foi a apresentação unilateral pela Presidência, sem um mandato do Grupo de Trabalho Intergovernamental, de novas propostas de texto na mesa de negociações antes do início da 8ª sessão, em outubro de 2022, minando a terceira versão revisada do tratado, que é o resultado das negociações intergovernamentais. Propostas que, como destacado por Pablo Fajardo da União dos Atingidos pela Chevron-Texaco (UDAPT, membro da Amigos da Terra Internacional), “enfraquecem as disposições do futuro tratado e põem em questão os acordos feitos”. O presidente pretende claramente diluir e comprometer o conteúdo do futuro tratado com a inclusão de suas novas propostas.

 

A Missão Permanente da Namíbia junto à ONU fez uma intervenção na mesma linha da Campanha Global, afirmando que “o status e o objetivo das “propostas informais do Presidente” permanecem pouco claros, apesar dos apelos feitos pelo Grupo Africano e outros países”. Devido a estas preocupações, estas propostas textuais deveriam “ser retiradas”, sugeriu o delegado da Namíbia, e a terceira minuta revisada seria “a única base para as negociações”.

Em seu discurso, o presidente do Grupo de Trabalho indicou que consultas informais entre sessões serão realizadas nos próximos meses “para tentar fazer avançar as negociações” sobre o futuro tratado. Parece que a presidência também pretende excluir os movimentos sociais e as comunidades afetadas das consultas inter-sessões. Esta é uma nova demonstração da linha seguida pelo governo equatoriano para avançar em direção a um tratado sem incluir as perspectivas das comunidades afetadas, mas integrando as propostas dos estados e entidades que defendem os interesses das TNCs.

A este respeito, em sua mensagem em vídeo, Antonio Salvador, representante da Força Tarefa Asiática para o Tratado Vinculativo, enfatizou que “somente com a participação plena e significativa dos movimentos sociais, sindicatos e organizações da sociedade civil (OSCs) a experiência destes trabalhadores pode ser refletida e abordada em um instrumento juridicamente vinculativo”. Portanto, instamos a Presidência a garantir transparência e mecanismos de consulta eficazes com as OSC no âmbito do próximo período inter-sessões”.

Nonhle Forslund, do Amadiba Crisis Committee South Africa, lembrou que o foco do Tratado vinculante tem que permanecer nas TNCs, e não em qualquer tipo de empresa. Nonhle enfatizou que “na maioria dos casos, nossos tribunais são incapazes de processar os TNCs, se for o caso”. Como sabemos, desde o início a estratégia do poder corporativo e de seus aliados políticos tem sido exigir que o âmbito do Tratado seja estendido a todos os tipos de negócios. Uma estratégia clara de desvio do foco do problema.

A este respeito, é altamente preocupante o “esclarecimento” sobre a questão do escopo feito nas Diretrizes das consultas inter-sessões publicadas pelo Presidente no dia 23 de março de 2023. De fato, a declaração de que “os Estados devem aceitar que o instrumento será aplicado a todas as empresas e atividades comerciais” é inaceitável, pois viola de forma flagrante o mandato original estabelecido pela Resolução 26/9. Uma nova tentativa de minar o caráter democrático do processo, ignorando as posições expressas por muitos Estados, especialistas, sociedade civil e organizações e movimentos das comunidades afetadas.

Em sua declaração, Nonhle também reiterou a necessidade de reconhecer o “Direito de Dizer NÃO” das comunidades a projetos corporativos, bem como a firme oposição da Campanha Global a qualquer tentativa de captura do processo por parte de corporações.

Ayushi Kaylab, da FIAN International, destacou a relevância de colocar os direitos humanos acima do direito privado ou comercial, estabelecendo exceções, quando necessário nesses regimes, para garantir o acesso à justiça efetiva para as comunidades afetadas além das fronteiras de seus países. Ela também destacou a importância de o tratado refletir diversas culturas jurídicas em suas cláusulas e não apenas as posições dominantes do norte global. Ela também se juntou à mensagem inequívoca da sociedade civil, apelando para a plena participação da sociedade civil e das comunidades afetadas no processo, inclusive nas consultas inter-sessões.

Finalmente, Samuel Geith, representante do CETIM, enfatizou que “os movimentos sociais, comunidades afetadas e Estados comprometidos com um Tratado Vinculativo, apelam para um instrumento eficaz cujo conteúdo aborde os desafios colocados pelos TNCs e preencha as lacunas legais existentes”, apelando aos Estados membros da ONU para que se engajem de forma construtiva nas negociações.

É necessário retornar ao curso original deste processo histórico, como definido pela Resolução 26/9, defendendo-o de ataques e instrumentalização. O Tratado Vinculativo pertence aos afetados, aos movimentos sociais, às classes populares que lutam contra a impureza corporativa.